O
POETA E OS CRÍTICOS -- Lêdo Ivo
Poeta
da noite e do sonho
que
ousa interrogar Deus
sem
nem mesmo conhecê-lo
direito
por linhas tortas,
assim
foi estampilhado
por um
crítico sagaz.
Mas um
outro proclamou:
És
poeta da claridade
e o
sol que trazes perturba
os
meus olhos fatigados.
Um
terceiro o definiu
como o
poeta do amor
e do
corpo feminino
que
freme na escuridão
como
rosa atravessada.
Um
resenhista apressado
o
limitou aos navios
que
ele viu quando menino
no
azulverde mar azul
da
península natal.
À luz
do estruturalismo
um
professor garantiu:
sei
ler a tua linguagem.
Teus
peixes e caranguejos
são
metáforas falazes.
Não me
engana o teu império
de
maceiós e alagoas
nem a
luz do teu farol.
Não me
ilude o goiamum
que
sorrateiro atravessa
a água
negra dos teus mangues.
Digo,
mesmo que te zangues,
que a
morte é tua matéria.
Um
poema de tua lavra
É
chave de cemitério.
E
aquele crítico atento
às
suas portas fechadas
e às
suas folhas caídas
chamou-lhe
poeta do tempo
e das
ilusões perdidas
e
invocava como prova
a fria
cinza nascida
de uma
fogueira no bosque.
Um
crítico o festejava
pelos
seus versos lacônicos
enquanto
outro o censurava
pelo
seu ritmo oceânico.
Pela
noite rodeado
ou sob
o sol caminhando
o ledo
poeta aturdido
por
tantas doutas versões
perguntava
aos seus botões
ou
indagava às estrelas
que
brilham mesmo ao céu claro
só
para quem sabe vê-las:
O que
digo quando digo?
Por
quem falo quando falo?
Já que
os críticos divergem
no
tamanho do meu metro
sou
parco ou sou excessivo
quando
entôo minha canção?
Onde
começo e termino?
Quem
sou? Quem fui? Quem serei?
Porque
sou um e sou vários,
ora
vivo dividido,
ora
morto esquartejado?
Eu sou
eu ou sou o outro,
esse
guerreiro ardiloso
que,
oculto em mim, me combate
na
batalha desigual?
Tantas
perguntas, e o dia
como
uma nuvem passava!
Só o
vento lhe respondia
No
silêncio do céu mudo:
--- És
como eu sou. Nada sei.
Sopro
noite e dia. E é tudo.
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