sexta-feira, 4 de maio de 2012

Murilo Mendes -- POEMA BARROCO

Os cavalos da aurora derrubando pianos
Avançam furiosamente pelas portas da noite.
Dormem na penumbra antigos santos com os pés
                                                                   feridos,
Dormem relógios e cristais de outro tempo, esqueletos de
                                                                             atrizes.
O poeta calça nuvens ornadas de cabeças gregas
E ajoelha-se ante a imagem de Noss Senhora das
                                                                 Vitórias
Enquanto os primeiros ruídos de carrocinhas de
                                                           leiteiros
Atravessam o céu de açucenas e bronze.


Preciso conhecer meu sistema de artérias
E saber até que ponto me sinto limitado
Pelos sonhos a galope, pelas últimas notícias de
                                                                  massacres,
Pelo caminhar das constelações, pela coreografia dos
                                                                     pássaros,
Pelo labirinto da esperança, pela respiração das plantas,
E pelos vagidos da criança recém-parida na Maternidade.
Preciso conhecer os porões da minha miséria,
Tocar fogo nas ervas que crescem pelo corpo acima,
Ameaçando tapar mues olhos, meus ouvidos,
E amordaçar a indefesa e nua castidade.
É então que viro a bela imagem azul-vermelha:
Apresentando-me o outro lado coberto de punhais,
Nossa Senhora das Derrotas, coroada de goivos,
Aponta seu coração e também´pede auxílio. 

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