(Fragmentos)
Porque escrevo estas linhas não somente com minha
vida
mas com o respiro de todos os fantasmas
que me amaram,
de todos os fantasmas que morreram e renasceram
com o rosto voltado para uma feroz desolação
culpando-me
Porque com culpa escrevo, com o lento rumor
de tuas roupas
caindo na penumbra de Genebra, quando ainda era
tempo
e os relógios ignoravam o perigo, suas agulhas
como o abraço de um náufrago na feliz profundidade,
minha boca perseguindo teu ventre no silêncio
que precede os incêncios
e as almofadas úmidas e os olhos que não verei nunca
mais
girando nos espelhos na noite infinita.
(...)
Já me esquecera de algo tão simples e verdadeiro
como beber um vaso de água, levantar-se na sombra,
dos quartos emprestados, deixar correr o tempo
ainda entre sonhos e logo acordar com a sede de
teu pescoço
Eu me esquecera que a vida também está feita de
todos esses ínfimos, esses heroicos acontecimentos
que se cumprem mal sabendo
entre um corpo desnudo e outro corpo desnudo,
entre o leito do rio e o vaso da boca.
(...)
Me esquecera de escrever simplesmente,
como quem bebe
ou ama, sem que o Olimpo me suba à cabeça.
Me esquecera de que um poema se prepara
com minuciosa alegria
como um presente que já ninguém espera,
e se modela com urgência
e violência, com irrpetível, com irremediável
ternura,
como fazer o amor com uma mulher
que vai morrer amanhã.
Tradução: Thiago de Mello.
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