(...)Não creio que a comemoração fúnebre nos aproxime dele (dia de
Finados), por ser quase mecânica e padronizada. Mas confio nesse estranho
trabalho de demolição interna, que se vai fazendo em nós. Vamos perdendo
as coisas, e sentimos que elas eram secundárias; com isto, descobrimos outras
subjacentes e mais importantes. Em camada mais profunda está colóquio
plácido com os mortos. E a descoberta: os mortos não são fúnebres.
Até alcançarem esta percepção, os mais sensíveis (tanto requintados como
simples) carregam uma saudade pungente que é, afinal, preliminar do
entendimento completo. Saudade às vezes impregnada de revolta, protesto de
amor ferido, ou mesmo de sentimento de beleza, que pretende parar sobre as
contingências, e busca a eternidade no instante.
Carlos Drummond de Andrade
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