quarta-feira, 29 de setembro de 2010

ORELHAS -- Declamador de Sonhos

COTOVIA SEM RIMA

Pode um poema mudar o mundo?

Com este Declamador de Sonhos, quarto livro de uma inquieta produção poética, Marco Plácido expressa que a poesia não se rende a manifesto algum. É, ela própria, o Manifesto maior de aprender a acreditar em sonhos impossíveis, de saber o fim / sem ter visto o início.

É esse vibrante cariz naïf que faz com que a poesia se desnovele num autêntico teclusdigitus: Sem muita frescura / Punk atitude / Marra carioca, no Ritmo da fera que não teme assumir seus insensatos e muito “A gosto” sabores do (Im)próprio Amor – reverberando tal clóvis ébrios de si mesmos nos antigos carnavais da Terra de Araribóia.

Nessa estante do nosso sentir, Plácido leva-nos através de ecos (sub)jazz(scentes) a uma variedade, digamos, de tradições-improviso, que retomam o gauche drummondiano, mas enraizado na releitura do mundo a partir dos clichês da vida cotidiana, abertamente confessional e flertando com seus limites na forma de uma cripto-paródia modernista, como nos insuspeitos versos do poema “Ancião” ou na fina trama do não menos insuspeito “Amor Esquecido”. Há também espaço para a memoralística de “Perguntas para Tetê” no qual a felicidade de hoje interroga a de ontem sobre as saudades que permanecem; nos vestígios meta-poéticos em Apenas pela vontade de mudar / Não se importando com a direção de “Manifesto-Poesia”; na incipiente visão social de “O Estofador”; ou na confissão de “Outro Como”, onde é inequívoco o sentimento de aprendizado daquele que não se entrega porque não consegue sentir; também presente na beleza rítmica dos versos de “Enigmático”, em que o poeta febrilmente interroga ... Quem comandará / Nossa direção... / para o agitado / final / do nosso / tempo.

Assim, nos deparamos ante uma pungente poética em formação que prima pelos tostões reflexivos sem rodeios. Nessa mirada, a canção da cotovia é a poesia sem rimas; se elas lá estão, talvez seja para nos lembrar do poder de nossas “Desvantagens Categóricas” .

Maria Isabel Oliveira Fróes Cruz

Bacharel em Letras e Tradutora

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