domingo, 23 de fevereiro de 2014

Ana Miranda, prefácio do livro "Tratado geral das grandezas do ínfimo" de Manoel de Barros

Você que vai ler este livro, será como voar deitado nas plumas macias do dorso de um passarinho, e voar. Os seus braços apertados em torno do passarinho vão sentir a pulsação no peito dele que será a batida de todo o sentimento do mundo.

Você vai voar um voo de conhecer um mundo que fica não só lá embaixo na terra, no caracol, no pantanal, nem nas nuvens que correm o céu todo do azul, mas um mundo que nunca esteve em lugar algum, porque está só nas rodas de vidro dos olhos do passarinho porque este passarinho sabe tudo o que não vê, e o que não é, por tanto ser. Nos olhos do passarinho tudo está, e o que é visto lá do alto no voo explica tudo tanto, que o mistério do mistério abrirá o seu coração por palavras que são chaves que abrem amores e lágrima, e as palavras que ainda não nasceram e são todo o impossível da vida e são a vida em orvalho, rastros, ventos, sonhos.

Você sentirá as inexplicáveis explicações que desexplicam o absurdo de ser, ou de se desachar que é. Você escutará o silêncio das pedras, das águas, dos chapéus, e o silêncio do seu próprio voo porque, ahhh sim, depois de voar no voo deste passarinho você vai saber voar sozinho, voc~e vai não saber o que sabe ser. Ele é tão inspirador, o nosso passarinho, que no convite da açucena a noite já estará pronta, prontinha, palavra por palavra, linha por linha. E você, em estado passarinho.


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