sábado, 16 de junho de 2012

Eliseo Diego, DIÁLOGO NA SALA

A água, que sacia a treva livrando-a da sede, purificando-a.

No copo a contemplo, transparente, poderosa e real como a graça.

O que diremos da água: sua cor opulenta nos alegra,
sua ágil forma de cervo nos regala os olhos, recriando-os.

Sua ágil forma de menina entre as rochas diz estranho nome.

Debaixo dos pinheiros voam as sombras, as silenciosas asas da chuva.

Pelo caminho chega quem comove seu manto em radiantes rajadas,

mãe ou rainha venerável, seus cabelos são cinzentos como o ar de
novembro.

Mas a menina foge pelo bosque, silenciosa volta á sua casa.
Quem, dizes, chora tão perto, onde somente vemos o torso, a deso-
lada velhice da samambaia?
Chora tão suave, sim, na verdade, tão suave como as tábuas escuras
lá de cima.

O viajante que toca em nossas portas olha a profunda sala e diz com
nostalgia: sua penumbra

explica uma cestinha de pão que vira numa sepulcro, e depois boa-
-tarde, já me vou.
Porém tu pensas na visitação funesta, e no sabor salobre das águas

inundando as fauces do maribundo transido de silêncio, de solidão
e imagens tediosas.

Enquanto lá fora, no jardim, alguém oficia, lava de desgosto as fo-
lhas das árvores,

aqui na sala bailam finíssimas sombras, as serpente e os animaizinhos
das águas.

Mas eu digo: olha a água doce adormecida entre as tuas mãos, o que
diremos da água.

No copo adormecida a água sonha o teu rosto, fiel recorda o teu
nome, minha amiga, a nostalgia.

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