domingo, 10 de junho de 2012

Eliseo Diego, Prólogo do livro Pelos estranhos povoados

Foi escrito este livro para minha Mãe, e para meus filhos, Constante Alejandro, Eliseo e Josefina. Aos quais eu gostaria de dizer logo como sucedeu que, por ter vontade de o ler, e não o encontrando, assim completo e pronto, por mais que o procurasse em muitos lugares diferentes, decidi finalmente escrevê-lo eu próprio. E acabei por concluir que haverá outras razões mais graves para fazer um livro, nenhuma porém mais legítima.

E uma vez escrito, e não achando uma razão suficiente para publicá-lo -- sendo, em relação aos outros, tão arriscada a que me levou a escrevê-lo -- e desejando justamente pôr estas palavras na primeira página; pensei que talvez poderia ser útil, não a meus filhos, que para eles foi escrito, mas a qualquer outro jovem que agora nem sei quem é. Foi o que pensei, sabendo que um livro anterior serviu a quem era então um menino, ou um pouco mais, e hoje é para mim um amigo e um poeta que o tempo engrandece. Porque sobre isso já não tenho dúvidas: ou um livro é útil ou não vale a pena, e quando dizemos que não serve -- pode haver algo mais tremendo? -- já dissemos tudo.

E para que serve um livro de poemas?, perguntariam agora, obedientes, os meus filhos. Servirá para atender, eu lhes responderia. Mestres maiores lhes dirão, com palavras mais nobres e mais belas, o que é poesia; baste-lhes, entretanto, se lhes revelo que, para mim, é o ato de atender em toda a sua pureza. Sirvam então os poemas para nos ajudar a atender como nos ajudam o silêncio ou a ternura.

Não é por acaso que nascemos num lugar e não em outro, senão para dar testemunho. Ao que Deus me deu de herança, creio que atendi tão intensamente quanto pude; às cores e sombras da minha pátria; aos costumes de suas famílias; à maneira com que se dizem das coisas; e as próprias coisas -- às vezes obscuras e leves às vezes. Comigo se vão acabar estas formas de ver, de escutar, de sorrir, porque são únicas em cada homem; e como nenhuma de nossas obras é eterna, nem sequer perfeita, sei que lhes deixo quando muito um aviso, um convite para que estejam atentos. Para estar, melhor do que nunca estive, no que Deus nos deu de herança.

Nenhum comentário:

Postar um comentário