domingo, 26 de junho de 2011

JOÃO CABRAL DE MELO NETO, poeta

"GRACILIANO RAMOS

Falo somente com o que falo:
com as mesmas vinte palavras
girando ao redor do sol
que as limpa do que não é faca:

de toda uma crosta viscosa,
resto de janta abaianada,
que fica na lâmina cega
seu gosto da cicatriz clara.


* * *

Falo somente do que falo:
do seco e de suas paisagens,
Nordestes, debaixo de um sol
ali do mais quente vinagre:

que reduz tudo ao espinhaço,
cresta o simplesmente folhagem,
folha prolixa, folharada,
onde possa esconder-se na fraude.


* * *


Falo somente por quem falo:
por quem existe nesses climas
condicionados pelo sol,
pelo gavião e outras rapinas:


e onde estão os solos inertes
de tantas condições caatinga
em que só cabe cultivar
o que é sinônimo de míngua.


* * *


Falo somente para quem falo:
quem padece sono de morto
e precisa ym despertador
acre, como o sol sobre o olho:

que é quando o sol é estridente,
a contrapelo, imperiosos,
e bate nas pálpebras como
se bate numa porta a socos.".

Nenhum comentário:

Postar um comentário