sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Tomas Tranströmer, RUAS DE XANGAI

1

A borboleta branca do parque é apreciada por muita gente.
Pessoalmente, adoro essa borboleta, é um pedacinho da própria verdade a esvoaçar!

Já de madrugada, multidões correm pelo nosso planeta em silêncio. É quando o parque se enche de gente. Em cada pessoa, oito rostos polidos como jade, para todas as situações e para evitar enganos.
Também em cada pessoa a tal cara invisível, a qual reflete "algo de que se não fala".
Algo que se revela em instantes de cansaço, é amargo como um gole de aguardente de víbora, e deixa na boca um travo prolongado a escamas.

As carpas do lago estão em constante movimento, nadam enquanto dormem, são um exemplo para o crente: em ação permanente.


2

É meio-dia. Roupa a secar esvoaça no cinzento ar marítimo bem por cima dos ciclistas
que surgem em cardumes compactos. Atenção aos labirintos laterais!

Rodeado de carateres chinos que não sei ler, sou um analfabeto perfeito.
Mas paguei tudo o que tinha a pagar e tenho recibo de cada coisa.
Não sei quantos talões indecifráveis já juntei.
Sinto-me uma velha árvore com folhas murchas que não caíram
nem podem cair ao chão.

Uma rabanada de vento, vinda do mar, faz ouvir toda essa papelada.


3

De madrugada, multidões pisam o nosso planeta em silêncio.
na rua estamos todos a bordo, os apertos iguais aos dos conveses
dos ferries.
Para onde vamos? Há canecas suficientes para o chá? Podemos dar-nos por felizes de termos tido lugar a bordo desta rua!
Levará mil anos até que haja claustrofobia aqui.

Sobre cada um de nós que por aqui anda, paira uma cruz que nos
quer alcançar, ultrapassar, unir-se a nós.
Algo que, por detrás, quer chegar a nós, tapar-nos os olhos e segredar-nos: "adivinha quem é!"

Ao sol, damos a impressão de sermos quase felizes e ao mesmo tempo sangramos de mágoas que desconhecemos.

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