quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

ALMA PERDIDA, de Valery Larbaud (Tradução de Drummond)

ALMA PERDIDA

A vós, aspirações vagas; entusiasmos;
cismas depois do almoço; impulsos do coração;
enternecimento que vem com a satisfação
das necessidades naturais; clarões de gênio; apaziguamento
da digestão bem feita; alegrias sem causa;
distúrbios da circulação do sangue; recordações de amor;
perfume de benjoim do banho matinal; sonhos de amor;
minha enorme molecagem castelhana, minha imensa
tristeza puritana, meus gostos especiais;
chocolate, bombons, doces de derreter, bebidas geladas;
charutos entorpecentes e vós, acalentadores cigarros;
alegrias da velocidade; doçura de ficar sentado; delícia
do sono na completa escuridão;
grande poesia das coisas; noticiário de polícia; viagens;
tziganos; passeios de trenó; chuva no mar;
loucura da noite febril, sozinho com alguns livros;
oscilações do temperamento e do tempo;
instantes de outra vida, reaparecidos; recordações, profecias;
ó esplendor da vida comum e do ramerrão quotidiano,
a vós esta alma perdida.

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