terça-feira, 29 de novembro de 2011

nasce, cresce e morre

À Isabel Scassa

a poesia nasce da necessidade de criar flores em balde; nasce da necessidade de explicar a angústia da solidão; nasce da emoção que o poeta tem de mostrar a emocionante aventura de estar emocionado com os fatos da vida; a poesia nasce do encontro de dois corpos que são, num momento, um único sólido e da emoção da despedida, o poeta tece fios do ouro saudade num poema dilacerado; nasce de todos os olhares que se perderam nesse mundo e que nunca mais se encontrarão por não haver tempo de se encontrarem, simples assim, mas por isso mesmo, cruel; a poesia nasce de todos os choros recolhidos dos homens-palhaços que precisam se esconder atrás do nariz vermelho e dos pés pequenos em sapatos enormes; a poesia nasce porque tem de nascer porque algo tem que acontecer entre o instante do susto e o da exclamação, a interrogação é estrume para a terra molhada pelas lágrimas amarguradas do poeta-menino assutado que escreve em apneia...

a poesia cresce em um coração de menino, que anseia por novas brincadeiras num mundo sem tempo para pique-esconde, amarelinha e salada de frutas; cresce junto com todos nós que não desatamos nossas vidas e ficamos olhando o tempo passar sem nos importar em sermos felizes, minimamente que seja, pelo menos vendo uma lagarta se transformar (precisamos todos voar?...); a poesia cresce e aparece sempre nos momentos de crise, sempre que os homens estão tristes, meio sem noção, sem orientação...(num mundo perfeito sorrisos seriam rimas e as palavras seriam desnecessárias para explicar a solidão -- que não existiria)...

a poesia morre quando o homem acha que o mundo é dele e mata a mata e mata com sede de vingança todos os outros seres todos os outros homens são meros joguetes em suas mãos de louco cientista pagão; a poesia morre sempre que um morador de prédio pensa que será assaltado por um mendigo que reclama de não ser ouvido (como ouvirmos um mendigo se não ouvimos aos nossos anseios?); toda vez que uma criança chora de fome a poesia falece e toda vez que morre a poesia nos entope a todos como se estivéssemos num quarto fechado esfumaçado de gás carbônico exalado por nossas torpezas; a poesia morre quando nos deixamos levar por nossas certezas e esquecemos de buscar o antigo olhar infantil que nos salvará a todos como uma religião que pudesse juntar o melhor de todos, nós sendo um só!

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