terça-feira, 14 de agosto de 2012

Nicanor Parra, MANIFESTO (parte I)

Senhoras e senhores
Esta é a nossa última palavra
Nossa primeira e última palavra --
Os poetas desceram do Olimpo.

Para nossos maiores
A poesia foi um objeto de luxo
Mas para nós
É um artigo de primeira necessidade.
Não podemos viver sem poesia.

Discordamos dos antepassados
-- Digo o que digo como todo o respeito --
Nós sustentamos
Que o poeta não é um alquimista
O poeta é um homem igual a todos
Um pedreiro que constroí seu muro:
Um construtor de portas e janelas.

Nós conversamos
Na linguagem de todos os dias
Não acreditamos em signos cabalísticos.

Além disso, uma coisa:
O poeta está aí
para que a árvore não cresça torta.

Esta é a nossa mensagem.
Nós denunciamos o poeta demiurgo
o poeta Barata
o poeta rato de biblioteca.
Todos estes senhores
-- digo o que digo com muito respeito --
por construir castelos em pleno ar
Por malgastar o espaço e o tempo
redigindo sonetos para a lua
Por reunir palavras ao acaso
Pela última moda de Paris.

Para nós, não.
O pensamento não nasce da boca,
Nasce do coração do coração.
Nós repudiamos
A poesia de óculos escuros
A poesia de capa e espada
A poesia de chapéu de abas longas.
Propiciamos, ao contrário,
A poesia a olho nu
A poesia a peito descoberto
A poesia de cabeça nua.

Não acreditamos em ninfas nem tritões.
A poesia tem que ser isto:
Uma moça rodeada de espigas
Ou então sem absolutamente nada.

(continua)

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