terça-feira, 1 de julho de 2014

Ferreira Gullar, O POÇO DOS MEDEIROS




O POÇO DOS MEDEIROS

Não quero a poesia, o capricho
do poema: quero
reaver a manhã que virou lixo

           quero a voz
a tua a minha
aberta no ar como fruta na casa
fora da casa
                  a voz
dizendo coisas banais
entre risos e ralhos
na vertigem do dia;
                            não a poesia
o poema o discurso limpo
onde a morte não grita


                                    A mentira

não me alimenta:

                           alimentam-me

as águas
             ainda que sujas e rasas
             afogadas
             do velho poço
             hoje entulhado
             onde outrora sorrimos


Ferreira Gullar

Nenhum comentário:

Postar um comentário