" O ALEIJADINHO, RETRATO FINAL
Era o gênio em ruínas.
Um lençol de asas brancas encobria
as repugnâncias.
Na cintura, o cordão da Confraria
dos Artífices de Cor.
Sobre as molas de arame da cabeça
desabava o chapéu de cogumelo.
Agachado, era o próprio cogumelo,
chapéu e corpo atarracados.
Na boca de rebordos obscenos
cambaleavam os negros cariados
pela viela torta das gengivas.
Talhando os oratórios nas igrejas,
suspenso nas roldanas e amarrado
nas cordas, parecia
uma aranha gigante balançando-se.
No trabalho noturno, a luz de azeite
projetava na tela dos altares
a sombra do monstro aracnídeo
que, movendo a mandíbula peluda,
engolia os arcanjos enleados
na teia dos florões.
Naquela pipa de dores,
nervos, rins, pulmões e coronárias
diluíam-se, filtrados.
no alambique de agonia.
Numa noite de trevas quando as trevas
de Ouro preto eram mais trevas,
finou-se o gênio
no catre-solidão.
Não teve os dedos cruzados sobre o peito
pois dedos, orelhas, o nariz e o sexo
morreram antes da morte.".
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