O
Purgatório é a casa do poeta. Sei que também o Inferno, com seus embates de
paixão. E o Paraíso também, com seus êxtases. Mas diz e repete meu coração que
o Purgatório é a casa natural do Poeta. E aqui mora e demora o poeta nas
pegadas do Irmão Maior, com seu coração sofrido porém não desamoroso. Aqui se
restauram suas forças, daqui parte para novos degraus de purificação e
mansuetude. Nestas plagas encontra velhos amores sempre verdes, mortos amigos
sempre vivos, confidentes, repletos de complacência, mestres de amor. Aqui
discorre do que adora com os artistas, conversa de ternura com os cândidos,
comove-se com os que guardam no peito o antigo relógio, alegra-se com o ruflar
das asas do anjo sobre cabelos revoltos. No Purgatório se concebe em névoas,
além do longe, a transcendência das cousas que passam mas não se perdem. O
homem compreende e confia, embora desconheça a derradeira palavra. E a
contenção e o sofrimento da espera se traduzem com nobreza, profunda e
moderadamente. Aqui existe silêncio, um silêncio vindo de outrora, contido em
si mesmo, igual à levedura que alimenta o pão e o faz crescer em ouro e flama,
o silêncio que suspende o respiro na expectativa da música, o silêncio que
preludia o fim dos trabalhos da alma, anunciar o cântico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário