domingo, 31 de julho de 2011

HERTA MÜLLER, escritor

"Não supero nada. Superar é uma palavra muito positiva. Ao escrever, conseguimos compreender melhor o passado. Mas, quando termino, estou de novo como comecei.".

quinta-feira, 28 de julho de 2011

POLLOCK, pintor

"Vulcânico! Tem fogo. É imprevisível. É indisciplinado... É generoso, explosivo, desalinhado...O que precisamos é de mais homens jovens a pintar a partir das impulsões interiores sem dar ouvidos ao que pensam os espectadores e os críticos -- pintores que arrisquem estragar uma tel para dizer alguma coisa à sua maneira. Pollock é um deles." (Sweeney)

quarta-feira, 27 de julho de 2011

LUCIEN MELO, Sleepy Elephant http://snd.sc/owKaUD

Sleepy Elephant http://snd.sc/owKaUD (ainda sem letra).

LUCIAN MELO, DJ, Disco Light Shhr http://snd.sc/pRGHWH (perigo azul)

Sussurros azucrinam minha escuridão
a luz no fim do tunel é ilusão?
Sãos
quem são
os sãos
desse planeta?
sem cerco
sem circo
quero de novo o início
de tudo quero um pouco
de atrito
de vício
perigo azul
quero norte
sou o sul
do horizonte
um monte blues!

Disco Light Shhr http://snd.sc/pRGHWH

segunda-feira, 25 de julho de 2011

MIRIAM ESTRELLA, poeta

Do que me cabe...
"... Na minha alegria cabe o riso. O riso daqueles que convivem comigo. De dias grandes cheios de gente dentro. De conversas jogadas fora. De gente fazendo gracinha só pra me encantar. Na minha amizade cabe um abraço. Daqueles que envolvem o mundo todin...ho com as mãos. Daqueles que esquentam e traz paz e carinho, aconchego e vontade de ficar morando dentro. Na minha prece cabe o outro. Aquele que mora do outro lado do mundo e que eu não conheço, mas sei que existe. Que existe e precisa de luz. Que existe e precisa de paz. Pra ele eu mando meus pensamentos mais bonitos, pra ele eu mando o pouco que me cabe, mas que é inteiro coração. Na minha solidão cabe um livro. Pode ser Clarice, Caio, Adélia ou "Plácido". Cabe um lágrima rolando sozinha, mas que me acrescenta algo de divino. A lágrima é que me humaniza. Faz com que eu estique a alma num varal de delicadezas. Na minha eternidade cabe nós. Cabe eu e minha família. Eu e meus amigos. Os de perto, os de longe, os do outro lado da tela do computador. Cabe os dias bonitos. Cabe os choros divididos, os risos compartilhados, os abraços jamais esquecidos. Cabe os laços, cabe as luzes, as memórias e suas saudades. Na minha vontade cabe um jardim. Uma casa toda branca com janelas azuis. Uma roseira no quintal e um girassol na porta de entrada. Cabe um amor limpinho morando dentro dela. Cabe eu e minha história, bordada de afinidades, amor e leveza.”

domingo, 24 de julho de 2011

bondade

olhos
sinceros
espertos
abertos para as maravilhas do mundo
juntos
estaremos sempre acreditando no valor da amizade
família
carinhos
bondade
sorte de termos letras para definirem para onde queremos ir
e sorrir

Sempre

mais uma primavera
de
amores
e cores
poucas dores
naturais sabores
mil folhas
de odores de flores
sorte
forte
sempre
juntos
sempre
búzios
sempre
verões
sempre
presentes
sempre
para você

quarta-feira, 20 de julho de 2011

ADÉLIA PRADO, poeta

"Casamento

Há mulheres que dizem:
Meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como "este foi difícil"
"prateou no ar dando rabanadas"
e faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.".

BANDEIRA TRIBUZI, poeta

"Poema

Um cão ladrou
na noite obscura
tremores frios
de inanição
A mulher magra
esperou cansada
que a carne exausta
fosse chamariz
Poucos sexos jovens
se investigaram
muitos não conseguiram
fugir à frustração
Alguns descansaram
outros se diluíram
o caixote do lixo
esperou esperou
Depois rompeu
a madrugada.".

LEONARDO FRÓES, poeta

"Introdução à arte das montanhas

Um animal passeia nas montanhas.
Arranha a cara nos espinhos do mato, perde o fôlego
mas não desiste de chegar ao ponto mais alto.
De tanto andar fazendo esforço se torna
um organismo em movimento reagindo a passadas,
e só. Não sente fome nem saudade nem sede,
confia apenas nos instintos que o destino conduz.
Puxado sempre para cima, o animal é um imã,
numa escala de formiga, que as montanhas atraem.
Conhece alguma liberdade, quando chega no cume.
Sente-se disperso entre as nuvens,
acha que reconheceu seus limites. mas não sabe,
ainda, que agora tem de aprender a descer.".

AMIGOS

Dia do amigo...
Quem são os amigos?
Filhos, esposas, maridos
irmãos, sogros, sogras
pais, mães, irmãos
que escolhemos
que a vida colocou no nosso caminho
findo
sinto
falta de todos
porque todos me completam
sendo uma parte de quem sou
receita de bolo
de carinho e
compreensão
comprimidos de amor em doses homeopáticas

domingo, 17 de julho de 2011

SELEÇÃO

...e agora os jogadores devem estar lavando a cabeça pensando em quanto irão ganhar no anúncio de shampoos amaciantes...esquecendo que a cabeça foi feita para pensar...
E nós continuaremos a torcer pela seleção...
da espécie
(de latinos para djavans)

sexta-feira, 15 de julho de 2011

A fórmula

Música:
sons
silêncio
tempo
temas

Poesia:
palavras
espaço em branco
pontuação
temas

Em matemática a fórmula seria a mesma, tenho certeza.

terça-feira, 12 de julho de 2011

retorno

as estações do ano voltam
ou
sou eu que retorno a vê-las com saudade?

ciência

ninguém em sã consciência
senta santa em cima da insistência de achar que um poema é uma ciência
mais uma verdade escrita

crença

ninguém escreve palavras
os poetas escrevemos sentimentos por palavras
as palavras se compõem e decopõem à proporção da crença do leitor

rupestre

...poucos tons...
numa pintura rupestre
a desesperada arranhada na pedra é arte
do pintor

outonos

mais uma primavera se foi
estou esperando
o novo frio
do novo inverno
em versos
me aqueço
me deságuo
me realejo
amanheço outonos
com olhos de verões

mato verde

afastado
por pontos e exclamações
por rios e rincões
risos e clarões
definem meu jeito
cínico e irônico
de olhar o mato verde
desejando
ver-te

segunda-feira, 11 de julho de 2011

ANTONIO OLINTO, poeta

"A SOMBRA

para Carybé


É água quando nágua cai
É terra quando está na terra
E o sol deseja tê-la sempre
No lado oposto
Equilíbrio e referência
Na hora do sol-posto ela se alonga
Torna-se fímbria
De horizonte
E sinto que também me entorno e alargo
No propagar e difundir
Derramar e espargir
Cada trecho meu que a sombra leva
Para longe
Mas logo o escuro geral
Vem da linha do morro e engole as coisas
Cada sombra recolhida em si mesma
Em água e terra
pacificada pela
Noite.".

MOACYR FÉLIX, poeta

"AUTORRETRATO

Certa vez, numa aventura estranha,
fugi
dos estreitos horários em que me estorcia
para uma ampliação sem fim.
Quando voltei
e senti, de novo, ferindo-me, o peso dos grilhões,
então não mais sabia quem eu era.
E nunca mais soube quem sou.
Talvez a sombra triste de um sonho de poeta.
Talvez a misteriosa alma de uma estrela
a guardar ainda no profundo cerne
a ilógica saudade de um passado astral.".

DANTE MILANO, poeta

"TERCETOS

Eu sou um rio, a água fria de um rio.
Profundo, cabe em mim todo o vazio.
Um reflexo me causa calafrio.

Sou uma pedra de cara escalavrada,
Uma testa que pensa, e sonda o nada,
Uma face que sonha, ensimesmada.

Sou como o vento, rápido e violento,
Choro, mas não se entende o meu lamento.
passo e esqueço meu próprio sofrimento.

Sou a estrela que à noite se revela,
O farol que vê longe, o olhar que vela,
O coração aceso, a triste vela.

Sou um homem culpado de ser homem,
Corpo ardendo em desejos que o consomem,
Alma feita de sonhos que se somem.

Sou um poeta. Percebo o que é ser poeta,
Ao ver na noite quieta a estrela inquieta:
Significação grande, mas secreta.".

CYRO PIMENTEL, poeta

"SÉCULO

Debruçado no tempo vejo à passagem
Das nuvens o reflexo
Da beleza ensinada pelos saudosos mitos.
Mas volvendo o rosto
lamento que o humano inventou:
A bomba atômica e a poluição,
A máquina,
A morte.".

BANDEIRA TRIBUZI, poeta

" A INEVITÁVEL

Insaciavelmente ela te espera
carnívora em seu furor uterino.
Movida pela fome de pantera
vigia teus descuidos de menino.

De numerosas tramas tece a espera
e os becos sem saída do destino
e em seu macio pelo esconde a fera,
a fúria, o enredo e o negro desatino.

Sempre atenta te espreita desarmado,
pronta a te desferir garra ferina
para sorver-te a vida àquela hora

insuspeita, fatal e inevitada.
Pois, se lhe foges, ela te fascina
e, se te entregas, ele te devora.".

JOSÉ PAULO PAES, poeta

" IL POVERELLO


Desgrenhado e meigo, andava na floresta.
Os pássaros dormiam em seus cabelos.
As feras o seguiam mansamente.
Os peixes bebiam-lhe as palavras.

Dentro dele todo o caos se resolvera
Numa ingênua certeza: -- "Preguei a paz,
Mostrei o erro, domei a força, curei o mal.
Antes de mim, o crime. Depois de mim, o amor."

Mas a floresta esqueceu, no outro dia,
O bíblico sermão e, novamente,
O lobo comeu a ovelha, a águia comeu a pomba,
Como se nunca houvera santos nem sermões."

JOSÉ PAULO MOREIRA DA FONSECA, poeta

" NÓS

nascemos na terra: verde e úmido pedregulho
a girar em torno do sol

estrela secundária nos confins da via láctea
perdida e salva
nesta coisa tão nítida quanto vertiginosa que chamamos espaço


somos prodigiosos e celestes
como um eclipse um cometa uma galáxia"

JOSÉ GODOY GARCIA, poeta

para Moacyr Félix e Caj

Há uma paixão no silêncio da terra.
Querem cegar a vida,
matar a esperança.

Mas é inútil.
Agora os homens estão silenciosos.
Por isso a terra é silenciosa.
Mas é no silêncio que os homens pensam.
Tudo que está paralisado
será posto novamente em movimento,
porque em verdade não parou.
É quando se pensa que mais se avança.

E com a mesma pontualidade com que o sol
faz a manhã,
uma outra manhã é feita nas mãos do homem.".

JOAQUIM CARDOZO, poeta

"AUTÔMATOS

No barulho das usinas,
Na sombra áspera e pálida que desce dos sheds,
Um dia os homens desapareceram.
No entanto
Braços de ferrogeticulam enérgicos,
Bocas, abertas, de fogo vociferam,
Ouvem-se vozes telegráficas de comando.

Autômatos!

Os homens se encantaram,
Se enlearam, se perderam
Nas formas e movimentos dos grandes maquinismos?

Ou são as almas que trabalham,
Almas forçadas, almas perdidas, almas penadas?

Oh! Com certeza os homens morreram
E às máquinas legaram
O sopro divino.".

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Todo

olhar azul
olhar perseguido por ondas
por monstras intenções
por inteiras demonstrações
de volúpia
de altura poética
cético quanto a presença de Deus nas pessoas, todas, tolas
resolvi meu problema inventando uma solução

Itabira

entre livros de auto ajuda
e os vampiros da vida
vou andando caminhando contra tudo contra todos que não querem parar para pensar em como a vida é difícil como tudo é muito mais complicado do que nos livros como é mais fácil observar um simples retrato e sofrer de saudade

IDEIAS

a ideia do absurdo me fascina raciocinar pelo absurdo demonstra o absurdo da tese contrária, quando absurda, senão vejamos: outro dia um amigo conversando comigo disse que o problema dos novos profissionais em qualquer área é que querem fazer o tipo bonszinhos, eu estou certo na minha inexperiência e eles errados, por isso, tudo para mim dará certo?! Respondi dizendo que na vida real é mais fácil vários mauzinhos se juntarem e darem "porrada" no bonzinho do que o contrário...estou errado?

...o mudo não para de falar já reparou? deve ser uma angústia danada raciocinar e não poder colocar em palavras, o gestual dos mudos numa conversa pública me mostrou a importância da palavra falada.


Os livros de auto ajuda, como o próprio nome diz, só ajudam aos seus autores...

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Filosóficas dúvidas

Amor é amor, não é poesia, não é Deus?
Deus é Deus, não é poesia, não é amor?
Poesia é poesia, não é amor, não é Deus?

arcada

queria te ver feliz todos os dias
felicidade é utopia?
esquina de cidade do interior que não existe no Rio?
o rio todo dia é um desafio enfrento trânsito sinais perigo de vida
todo dia esqueço uma rima para me lembrar de você todo dia sonho com sorrisos mas enfrento dentes mesquinhos todo dia todo dia é uma luta diária todo dia tenho dor na arcada mas não paro de enfrentar
(de me enfrentar)

cientistas

os cientistas mapearam todo o cérebro e não acharam nada escondido nada ficou subentendido nada de amor? de ódio? de paixão? de ócio? desconfio da ciência como eles desconfiam da poesia

Maratona

Tudo na vida tem motivo, dizem.
Quais são os motivos de matarmos os micos?
os aflitos continuam se drogando pelo amor ao vício?
sendo sem destino por que gostamos de nos enganar?
onde estão os caras que têm coragem de nadar nessa maratona sem água?

Revelation

Muito engraçado esse momento, outro dia estava no salão dos amigos Wágner e Márcia, esperando pra cortar o cabelo, acompanhado do guardião da minha barriga -- um copo de açaí, quando a Márcia me perguntou se podia cantar uma música que um seu cliente, saxofonista de oitenta anos, fez para Lara, sua filha. Confrontado com uma folha pautada e todos aqueles sinais das notas musicais disse: "Márcia posso cantar mas não sei ler música!". Depois das risadas, chegou um senhor, amigo do casal e começou a cantoria de uma bonita valsa. Em casa, com calma pensei:" Puxa, que astral, em todos os lugares que frequento estou envolto por músicas e poesias!

fogo de palha

gostaria de lhe contar o quê aprendi
mas se conseguisse me lembrar não estaria aqui
estaria vivendo
roubando a maçã do tempo por aí
chovendo histórias
mascando memórias
espremendo vida entre dedos
de cores adivinhas
tintas inventadas
seriam pirraça em outro idioma
estaria me contando uma soma
diferente de tudo que vejo
diferente de dois dedos digitando fogo de palha

dados

o futuro
chama
esperança
ilusão de andança com direção
o presente é
apenas uma sensação
o passado
são dados já jogados
riscados
por antigas ilusões

Esperanço

Esperanço
ranço de esperança tanta
que afeta minha santa
minha santa ignorância
reverencio os mestres
escuto o cantar dos pássaros
mas não me prendo ao passado
rio e planto um futuro
relaxo no escuro
na dança
na esperança
de esperança tanta
quero me fartar

CLARICE LISPECTOR, escritora (4)

(...) A água secou na boca. A msoca bate no vidro. O sono do menino é raiado de claridade e calor, o sono vibra no ar. Até que, em pesadelo súbito, uma das palavras que ele aprendeu lhe ocorre: ele estremece violentamente, abre os olhos. E para o seu terror vê apenas isto: o vazio quente e claro do ar, sem mãe. O que ele pensa estoura em choro pela casa toda. Enquanto chora, vai se reconhecendo, transformando-se naquele que a mãe reconhecerá. Quase desfalece em soluços, com urgência ele tem qu se transfromar numa coisa que pode ser vista e ouvida senão ele ficará só, tem que se transfromar em compreensível senão ninguém o compreenderá, senão ninguém irá para o seu silêncio ninguém o conhece se ele não disser e contar, farei tudo o que for necessário para que eu seja dos outros e os outros sejam meus, pularei por cima de minha felicidade real que só me traria abandono, e serei popular, faço a barganha de ser amado, é inteiramente mágico chorar para ter em troca: mãe.
Até que o ruído familiar entra pela porta e o menino, mudo de interesse pelo que o poder de um menino provoca, para de chorar: mãe. Mãe ´: não morrer. E sua segurança é saber que tem um mundo para trair e vender, e que o venderá.
É mãe, sim é mãe com fralda na mão. A partir de ver a fralda, ele recomeça a chorar.
-- Pois se você está todo molhado!
A notícia o espanta, sua curiosidade recomeça, mas agora uma curiosidade confortável e garantida. Olha com cegueira o próprio molhado, em nova etapa olha a mãe. Mas de repente se retesa e escuta com o corpo todo, o coração batendo pesado na barriga:fonfom!, reconhece ele de repente num grito de vitória e terror -- o menino acaba de reconhecer!
-- Isso mesmo! diz a mãe com orgulho, isso mesmo, meu amor, é fonfom que passou agora pela ru, vou contar para o papai que voc~e já aprendeu, é assim mesmo que se diz: fonfom, meu amor! diz a mãe puxando-o de baixo para cima e depois de cima para baixo, levantando-o pelas pernas, inclinando-o para trás, puxando-o de novo de baixo para cima. Em todas as posições o menino conserva os olhos bem abertos. Secos com a fralda nova.".

CLARICE LISPECTOR, escritora (3)

(...) Mas ele comete um erro: pestaneja. Ter pestanejado desliga-o por uma fração de segundo do retrato que o sustentava. O equilíbrio se desfaz -- num único gesto total, ele cai sentado. da boca entreaberta pelo esforço de vida a baba escorre e pinga no chão. Olha o pingo bem de perto, como a uma formiga. O braço ergue-se, avança em árduo mecanismo de etapas. E de súbito, como para prender um inefável, com inesperada violência ele achata a baba com a palma da mão. Pestaneja, espera. Finalmente, passado o tempo necessário que se tem que esperar pelas coisas, ele destampa cuidadosamente a mão e olha no assoalho o fruto da experiência. O chão está vazio. Em nova brusca etapa, olha a mão: o pingo de baba está, pois, colado na palma. Agora ele sabe disso também. Então, de olhos bem abertos, lambe a baba que pertence ao menino. Ele pensa bem alto: menino.
-- Quem é que você está chmamndo? pergunta amãe lá da cozinha.
Com esforço e gentileza olha pela sala, procura quem a mãe diz que ele está chamando, vira-se e cai para trás. Enquanto chora, vê a sala entortada e refratada pelas lágrimas, o volume branco cresce até ele -- mãe! absorve-o com braços fortes, e eis que o menino está mais perto, agora: a mesa, embaixo. E, como ele não pode mais de cansaço, começa a revirar as pupilas até que estas vão mergulhando na linha de horizonte dos olhos. Fecha-os sobre a última imagem, as grades da cama. Adormece esgotado e sereno.

(continua no item 4)

CLARICE LISPECTOR, escritora (2)

(...) O próprio menino ajudará sua domesticação: ele é esforçado e coopera. Coopera sem saber que essa ajuda que lhe pedimos é para o seu autossacrifício. Ultimamente ele até tem treinado muito. E assim continuará progredindo até que, pouco a pouco -- pela bondade necessária com que nos salvamos -- ele passará do tempo atual ao tempo cotidiano, da meditação à expressão, da existência à vida. Fazendo o grande sacrifício de não ser louco. Eu não sou louco por solidariedade com os milhares de nós que, para construir o possível, também sacrificaram a verdade que seria uma loucura.
Mas por enquanto ei-lo sentado no chão, imerso num vazio profundo.
Da cozinha a mão se certifica: você está quietinho aá? Chamado ao trabalho, o menino ergue-se com dificuldade. Cambaleia sobre as pernas, com a atenção inteira para dentro: todo o seu equilíbrio é interno. Conseguido isso, agora a inteira atenção para fora: ele observa o que o ato de se erguer provocou. Pois levantar-se teve consequências e consequências: o chão move-se incerto, uma cadeira o supera, a parede o delimita. E na parede tem o retrato de O menino. É difícil olhar para o retrato alto sem apoiar-se num móvel, isso ele ainda não treinou. mas eis que sua própria dificuldade lhe serve de apoio: o que o mantém de pé é exatamente prender a atenção ao retrato alto, olhar para cima lhe serve de guindaste.

(continua no item 3)

CLARICE LISPECTOR, escritora (1)

No conto MENINO A BICO DE PENA

"Como conhecer jamais o menino? para conhecê-lo tenho que esperar que ele se deteriore, e só então ele estará ao meu alcance. Lá está ele, um ponto no infinito. Ninguém conhecerá o hoje dele. Nem ele próprio. Quanto a mim, olho, e é inútil: não consigo entender coisa apenas atual, totalmente atual. O que conheço dele é a sua situação: o menino é aquele em quem acabaram de nascer os primeiros dentes e é o mesmo que será médico ou carpinteiro. Enquanto isso -- lá está ele sentado no chão, de um real que tenho de chamar de vegetativo para poder entender. Trinta mil desses meninos sentados no chão, teriam eles a chance de construir um mundo outro, um que levasse em conta a memória da atualidade absoluta a que um dia já pertencemos? A união faria a força. Lá está ele sentado, iniciando tudo de novo mas para a própria proteção futura dele, sem nenhuma chance verdadeira de realmente iniciar.
Não sei como desenhar o menino. Sei que é impossível desenhá-lo a carvão, pois até o bico de pena mancha o papel além da finíssima linha de extrema atualidade em que ele vive. Um dia o domesticaremos em humano, e poderemos desenhá-lo. Pois assim fizemos conosco e com Deus.

(c0ntinua no item 2)

terça-feira, 5 de julho de 2011

pontos cardeais

...é muita coisa
e o nada também
é poder me desnudar e também nadar em qualquer lugar
seja piscina, vulcão ou praia
é um monte de gestos legais e cestos sentidos de palha
é tanto aquele ranço de esperança tanta e também uma preguiça branca
é uma coleção de besouros combinada com um enjôo
é um pouco de vaidade misturada com ingenuidade
é uma mistura de passado, chorado
de presente, magoado
com futuro, um fruto
que sou eu
expondo os pontos cardeais em orações cardinais

Escrever é... (10)

Escrever não é muito difícil, muito difícil é viver. No conjunto vida estão inseridos outros escaninhos: poesia, música, cinema, matemática etc.
Se o cabra aprendeu um pouco da sua respiração na vida real e se tiver a mínima capacidade de escutá-la irá conseguir transmitir ao próprio texto seus arremedos.
Explico, cada um tem seu jeito de contar uma história por isso falo que falar ajuda a captar esse trejeito e que se não houver grande censura sobre o conteúdo acaba chegando às linhas do escrito.
Então, recordemos alguns passos:
1 -- ler para aumentar o vocabulário e descobrir alguns bons exemplos de textos;
2 -- escrever tudo o que vem à cabeça e depois cortar; ou
3 -- sintetizar em palavras-DNA aquilo que se quer escrever e depois encher linguiça;
4 -- para treinar não se censurar treinar o máximo de exposição da figura possível, seja falando, cantando, dançando etc.

agora...

quando menino
via Chico, Tom, Vinícius
como eles queria fazer o bem
fazer bem...
não tinha olhos azuis
não tocava piano
não era poeta
mas
agora...

segunda-feira, 4 de julho de 2011

deserto azul

...em pedaços...
o passado vem em pedaços
imagens
preenchem o olhar vago
iludem pintando o deserto de azul
o sol de carmim
o dó de sim

Mestre

A Ralph Porto

Mestre do silêncio azul
lhe pergunto
corremos contra a lembrança?
andamos com esperança?
nadamos olhando o azul que nos ilude a amar?

Desnudo

Não envelhecemos por meses
envelhecemos por eventos
quando meu terceiro filho nasceu
de quarenta passeia a vinte
quando minha mãe morreu de quarenta e cinco passei a sessenta
é assim que a vida se apresenta
não há amor que cubra
a ausência que se desnuda

escanteio

escrevo há três e canto há dois escrevo há três e canto há dois escrevo há três e canto há dois escrevo há três e canto há dois

Agradeço o cimento (da amizade)

É difícil agradecer
(levei anos para aprender)
agradecer
é estender os olhos
e reconhecer
os outros
muito difícil isso
é mais fácil nos fecharmos em nós
mas e os laços do presente?
e os passos?
(os passados?)
sempre serão marcantes
se soubermos derrubar o muro que nos afasta
projetando um jardim de futuros
abraços, beijos e palavras
que demonstram a força do que temos por dentro
demonstram aquilo que queremos
com amor, fé e amizade
um simples sussurro vira uma declaração
(de amor)

domingo, 3 de julho de 2011

perda de árvores

esse minuto é o último minuto
então irei aproveitá-lo num suicídio
escrito
não consigo dedilhar palavras
como uma sinfonia quero emocionar escrevo para provocar a inquietação necessária aos que sabem o que é viver verdadeiramente sem deixar de lado nada sem desperdiçar palavras sem essa pretensão não há arte só perda de tempo e de árvores

abluesado

gosto do gosto de Deus no rosto uma linha de gozo de dedilhada nas cordas de um violão abluesado pintado de de um azul de céu estrelado conhecimento da situação única sensação de pertinência essência de tudo que não seja maldade

contumaz

noites só são eternas quando acompanhadas
do perfume da ilusão
desejadas noites sendo estrelas
senso de luxúria condensada
num olhar caminhando para a paz
estoque de sentidos contumaz

Escrever é... (9)

Após inúmeros textos, o método pouco importará na medida em que o treino ou adestramento do talento (como diz Olivetto) já proporcionará a saída da ideia com qualidade que será melhorada logo depois da primeira leitura.

Um truque para melhorar o desempenho é copiar um pequeno texto (poesia ou crônica) que ensinará o ritmo de um texto. Nesse sentido, há a soma de dois aspectos, melhora do texto (principalmente o ritmo, ou métrica no caso de um poema) em função da qualidade da obra copiada e aumento de vocabulário.

O esforço logo será recompensado pois são várias variáveis sendo atacadas ao mesmo tempo, o que certamente influirá decisivamente na rapidez da qualidade e facilidade da produção do texto.


AVISO: Cópia de textos de autores reconhecidamente talentosos. Nada de Potters e Vampiros da vida, que não são literatura são entreterimento (passatempo).

Escrever é... (8)

Esse poema é um exemplo do método palavra-DNA para a ampliação:

e s c r e v o

escrevo
escrevo pelo
escrevo pelo sofrimento
escrevo pelo sofrimento da
escrevo pelo sofrimento da consciência
escrevo pelo sofrimento da consciência da
escrevo pelo sofrimento da consciência da perda
escrevo pelo sofrimento da consciência da pedra

técnicos

escrevemos
ideias e sentimentos
somos sensos
estéticos tentos
técnicos da seleção
das rimas
das cismas
das primeiras intenções

guidão

único animal
em que o tamanho não importa
parado
apenas com o cérebro
escrevo uma ópera
de longe um cientista-médico ajuda numa operação
um esquimó pode fazer uma canção sobre índios brasileiros que anoitecem com a mata e no entanto não matam minha sofreguidão Picasso com um guidão fez um touro um bigode definiu nossa andança surrealista uma lista salvou parte de uma nação

bárbaras

se tudo já foi dito
minto
para continuar bebo
tintas palavras
uvas encefálicas
bárbaras
na capacidade falha
de me enganar
se tudo já foi dito
minto
em tudo encontro um caminho
bêbado
fio de linho
que nina minhas ideias

nevoeiro

são os ossos que me sustentam
a carne fraca
fracassou
se nega a me manter rosa
vermelho que seja
se nega e negando-me me desfalece
enfraquece toda a teoria é um simples nada
toda ilusão lustra a estrada da vida que é embaçada azulada pelo nevoeiro de nossos defeitos

surto

mais um verão se foi
difícil passagem
em uma ano tanta coisa aconteceu
tantos planos
mais desenganos
visão da vida
como
um susto
um surto
de falta de criatividade
tudo o que mais negamos é e o que mais sabemos e esse ano que passou aconteceu

Karmas e odaras

quantas pessoas no mundo
(nesse imundo susto)
podem se dar ao luxo
de se deixar levar
no fluxo contínuo do amor
pelos outros karmas
pelas outras odaras
que saram
que saram?

Escrever é... (7)

Então, tentando o outro método (ii) irei ampliar e depois cortar e depois farei o contrário:

(iia) li o Olivetto que dizia que o poeta se preocupa com a beleza da poesia, o publicitário usa a escrita para vender o produto enquanto o humorista se preocupa com a forma da piada. Entendi, então, que um, se preocupa com o conteúdo, o poeta, e os outros com a forma da mensagem, peça publicitária, o publicitário; e, piada, o comediante.

POEMA:
a beleza seduz o poeta
a venda o publicitário
a piada o otário
que conta ou que ri?
todos vendem um pouco de si


(iib) aqui mais do que sair escrevendo muito, o importante é saber o que é fundamental, e depois de estabelecer as palavras-DNA, escrever, desse modo fica assim:


presente passado e futuro
poeta comediante publicitário
conteúdo forma escrita

POEMA:

O poeta sonha o futuro
escrevendo bonito
tudo
o publicitário se fixa no passado das pessoas
produto que soa ressoa na lembrança dos consumidores
os atores comediantes gostam da risada presente
frequente

Entenderam?

Escrever é... (6)

(i) MÉTODO ALEATÓRIO

Depois de ter lido um livro do Washington Olivetto, em que ele falava, entre outras coisas, sobre a diferença entre o poeta, o humorista e o publicitário queria escrever um poema que estabelecesse a diferença entre eles dizendo que seriam: passado, presente e futuro.

Conversei com minha esposa a esse respeito e acabou saindo esse poema (que , na verdade não estabeleceu a diferença):

Notório

À procura do futuro está o poeta
vive a vida sem muros
sendo o fruto quando ilumina
sendo ouro
revés do estouro
que apoquenta
público e notório
sendo o gosto amargo do osso
passado sendo gasto de presente
quando ausente

Escrever é... (5)

No processo de escrever pelos cotovelos comecei a perceber basicamente dois modos de fazer um poema:
(i) totalmente aleatório, tipo ouvir uma frase do nada e começar a escrever (Esse método não ajudará ninguém nunca, pois é a verdade de um cara que escreve);
(ii) o segundo jeito é começar escrevendo tudo que vem á cabeça e depois ordenar ou pensar no núcleo do que vai ser escrito e depois aumentar.


O primeiro, apesar de ser extremamente pessoal pode ajudar na medida que estabelece o caos e depois disso as coisas já foram escritas, de um modo aleatório mais foram. Em poesia, essa espontaneidade é fundamental, depois sim, entra a parte intelectiva que irá minimamente tentar ordenar o raciocínio.


O segundo, pode ajudar um começo titubeante. Assim, se por característica for mais fácil escrever tudo, escrevamos e depois adequaremos cortando os excessos. Porém, se formos mais lacônicos estabeleceremos as palavras-chaves e depois aumentamos a história.

Vamos aos exemplos?

Escrever é... (4)

Então, algumas conclusões ao método (nada) plácido de escrever é:

(i) leia muito para adquirir vocabulário. Leia qualquer coisa, de bula de remédios a Pessoa; de Harry Potter a Carlos Nejar. Leia, leia, leia...LER QUALQUER COISA É MELHOR DO QUE NAO LER!

(ii) Fale pelos cotovelos que escreverás pelos cotovelos também. A exposição ao contraditório irá te treinar a perder a vergonha de se mostrar, falando ou escrevendo.

(iii) se não gosta de falar se exponha de outro jeito, para treinar a se mostrar. Talvez quem sabe, criar um blog com pseudônimo e soltar os bichos; ou, ir ao Maracanã e detonar o time adversário, qualquer coisa que te faça se acostumar à exposição. Quando comecei a pensar em cantar sabe o que fazia? Sentava embaixo da televisão nos restaurantes de comida a quilo da vida para me sentir olhado...

Cada doido com sua técnica.

Escrever é... (3)

Comecemos pelo fim, indiscutível que ler aumenta o repertório de palavras, aumenta a capacidade de reconhecer bons textos e com isso facilita o trabalho de elaborar as próprias experiências no momento de escrevê-las.

Agora, não adianta isso se falamos pouco. Desculpem os não-falantes, mas falar é fundamental, pelo menos na minha experiência, quanto mais nos arriscamos mais estaremos aprendendo a reagir às considerações urgentes que são necessárias para travar um diálogo. E explico: ao falar estamos sempre entrando em contraditório. Por mais que não queiramos, a discórdia aos nossos pontos de vista será interessante para o treino da oposição de pensamentos e é essa oposição que, na constância, nos fará pensar de modo mais claro para que possamos demonstrar onde queremos chegar com nosso raciocínio, espelhado em palavras faladas.
E, por consequência, ao nos treinarmos nas palavras faladas estamos praticando, sem nos dar conta, escrevê-las de modo claro quando necessário.


A exposição do falante é diária. E essa disposição à exposição sem dúvida ajuda na hora de encaixar as palavras em seus devidos lugares. Um calado então não pode escrever bem?! Lógico que pode. O que quero dizer é que para a maioria das pessoas será menos sofrido o ato em si de escrever para aqueles que estão mais acostumados à exposição.

Escrever é... (2)

Quanto mais o cabra falar mais solto estará para escrever. Tese louca? Será? Quem fala muito normalmente se mostra mais e escrever é se mostrar.

Não adianta nada fazer curso com o poeta fulano de tal se a pessoa não quer escrever seus sentimentos e os fatos que marcaram até ali sua trajetória. Quer se esconder? Então não escreva! E aquela desculpa de que apenas está fazendo um texto técnico e por isso se sente a vontade...ESQUEÇA! Sempre ao escrever mostramos o que achamos importante e nos colocamos de um modo ou de outro.

Assim, duas doideiras foram registradas: (i) que quem fala mais tem mais facilidade para escrever e (ii) quem quer se mostrar acaba com menos dificuldade de escrever.


E ler ajuda?

Atacarei os três pontos no próximo post.

Escrever é... (1)

Depois de três anos escrevendo tudo que vivi durante meus quase quarenta e seis anos de idade resolvi dividir algumas verdades que, acho, vão ajudar a quem quiser começar a tentar escrevinhar algumas linhas, alguns fatos, alguns projetos, atos etc.

Em primeiro lugar, devemos nos lembrar que a escrita tem como objetivo conseguir registrar o jeito que falamos. Desse modo nada de ficar censurando esse ou aquele modo, não há jeito certo de escrever, assim como não há jeito correto de falar. O importante é conseguir se comunicar, isto é, ser compreendido pelo interlocutor e conseguir transmitir a ideia desejada, mantendo o interesse por aquilo que foi objeto da escrita.

Antes de começar a pensar em escrever essa série, li vários livros de como fazer uma redação e não vi nada com o enfoque que pretendo transmitir. Registro, porém, que comecei a escrever da necessidade extrema de transbordar, não sou teórico, aliás, odeio teoria, mas considero que como um pouco de calma a incessante prática permite alguma teorização.

Vamos a ela no número 2 desta série.

Inferno

identificado...
identificado...
pela força do bem
pela força do hábito
habito as profundezas
do riacho
o cacho de uva
visita constante
das rimas
que num instante
qualquer
me visitam
instigam
irritam
os outros não sabem
não vêem
não sentem
não escutam
os ossos próprios
se chocarem
com a incúria
abjetos objetos
da fúria
que trago no hálito
de inferno
informo:
cuidado!

tatus

Todos tatuados
(tatus nos mesmos buracos)
todos com a mesma cara
todos acostumados
procurando roupas caras
procurando o mesmo cara?
mas que nada
ninguém irá mudar
independentemente do canto do país
todos querem se acostumar com as mesmas roupas as mesmas caras procurando não procurar
porque quem procura pode achar

Notório

À procura do futuro está o poeta
vive a vida sem muros
sendo o fruto quando ilumina
sendo ouro
revés do estouro
que apoquenta
público e notório
sendo o gosto amargo do osso
passado sendo gasto de presente
quando ausente