sábado, 30 de abril de 2016

366 dias com poesia, 30 de abril de 2016 -- INFINITO

INFINITO

À memória de Carlos Frederico, que nos deixou aos trinta anos

Cara
A falta que sinto de você não tem nada a ver com o passado
Sinto falta de você aqui convivendo conosco
Seus sobrinhos iam se amarrar no seu jeito
Iam te abraçar e beijar e rir muito das suas histórias
Algumas tive que inventar de memória
Suprimindo uma saudade que eles têm de você do pouco que eu falo
É difícil ainda dói às vezes é mais fácil escrever o que sinto
Sinto muito muito mesmo não ter tido tempo de te conhecer como seus amigos te conheceram e choram no meu ombro quando nos encontramos
Todos passaram naquele dia 22 de julho de 1997 em diante a carregar uma mágoa da vida
Passaram a conhecer a crueldade da falta de despedida
Todos sem exceção gostam de mim e de Luiz apenas por sermos seus irmãos
E isso é o mais bonito que você nos deixou
Até um dia desses quando se for possível riremos muito de tudo o que fizemos neste mundão infinito

sexta-feira, 29 de abril de 2016

366 dias com poesia, 29 de abril de 2016 -- novelo

novelo

A Angélica Plácido

pairando
sobre as letras desse livro de poemas
vejo uma asa
do anjo
amor
fios do seu cabelo
formam
o novelo-sentença
que me define como poeta


Do livro HÁmor, 2014.

quinta-feira, 28 de abril de 2016

366 dias com poesia, 28 de abril de 2016 -- Lago

Lago

...derramam...

seus olhos derramam, de rimas
lágrimas
(lago de rimas?)
desviam
palavras
da poesia...

devias chorar mais!



Do livro HÁmor, 2014.

quarta-feira, 27 de abril de 2016

366 dias com poesia, 27 de abril de 2016 -- 3 momentos

3 momentos

Comentário num post de Sílvia Tavares

o silêncio é a música da alma
por isso acalma
o tempo é a ilusão em forma de silêncio
por isso assusta
a música é a quebra da ilusão
dança dos signos
momento em que rimos de nós

terça-feira, 26 de abril de 2016

366 dias com poesia, 26 de abril de 2016 -- ilusionista

ilusionista

ilusão de palavras que não voltam, partiram dessa para aqueloutra que não sei se existe insistem em dizer que sim insisto em achar que não pois então velha discussão sem comprovação por isso prefiro adiar o encontro com a ilusão, iludindo-me


Do livro HÁmor, 2014.

segunda-feira, 25 de abril de 2016

366 dias com poesia, 25 de abril de 2016 -- Cello

Cello

o que pensam de mim para eles sou eu
o que penso de mim para eles sou céu
cello tocando música de anjos
demônios pensando sobre minhas afirmações
somos detalhes num mundo de ilusões
eles são vocês que não somos nós
eles são nós que desato em letras
que enlaço em poemas


Do livro HÁmor, 2014.

domingo, 24 de abril de 2016

366 dias com poesia, 24 de abril de 2016 -- trêmulo

trêmulo

A Walcir Pereira da Silva

sempre peço medo
para tentar desvendar o segredo
da vida
para tentar desvendar o segredo
aceso
tento
tendo
a voz e os lábios trêmulos
mas
que não falharão ao cantar
que não falharão ao tentar
me desvendar


Do livro HÁmor, 2014.

sábado, 23 de abril de 2016

366 dias com poesia, 23 de abril de 2016 -- dentista

dentista

A Leandro Passos

não sei se devo falar...às vezes me vejo sendo um velho homem querendo relembrar e da lembrança gostar de chorar esperança de tudo aquilo que me trouxe até aqui e me fez estar ainda aqui ferido mas sorrindo dentro das minhas parcas possibilidades todo dia vôo e vôo como só uma borboletra poderia voar em letras encontro sempre um caminho de volta e me pacifico esperando que outros olhos vejam tudo aquilo que estou plantando e não são sonhos desculpem não posso concordar com uma palavra que engorda mas minimiza o jardim de doces em que estou cativando um futuro menos duro mais ou menos como um dentista que arranca os dentes de leite porque sabe que logo num piscar de olhos aquelas crianças que sangram serão adultos que sangram esse desejo de ver o que está a me esperar que chamam de esperança chamo de vontade e calor um sol por isso durmo sem cobertor e me sinto tranquilo quando alguém desconhecido vem em minha direção como se houvesse uma conspiração de emoção como se todos já soubessem que um poeta só morre por falta de crença


Do livro HÁmor, 2014.

sexta-feira, 22 de abril de 2016

366 dias com poesia, 22 de abril de 2016 -- sóis 2

sóis 2

A Daniel Waddell Pessoa

somos
nossos olhos
nossos remorsos
os gostos
o esforço
o sóbrio paladar acre
na vida
somos nós
sós

os outros são
só(s)
uma parte
de nós
de árvore
de pedaços
de histórias
de sóis
de tudo
aquilo que não temos
e por isso
dos nossos desejos...


Do livro HÁmor, 2014.

quinta-feira, 21 de abril de 2016

366 dias com poesia, 21 de abril de 2016 -- Thiago e o cão

Thiago e o cão

O cachorro do Thiago se chama Júnior -- homenagem ao ex-par da Sandy, a cantora. Perdi um filho, o cão ganhou um pai. O dia inteiro o menino se preocupa em cuidar do cãozinho que, sapeca, retribui com giros e lambidas. O dia inteiro...um não larga o outro e no fim do dia só um banho caprichado diferencia o moleque do cão -- tanto chamego só acaba lá pelas nove horas, hora em que o rebento é obrigado pela mãe a ter um encontro com água, sabonete e esfregão. Não sem antes implorar por um último afago no Juninho, que, qual uma bola de pêlo, agradece com lambidas e ganidos dum animal já ferido pela saudade do menino-pai-alegria.


Do livro HÁmor, 2014.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

366 dias com poesia, 20 de abril de 2016 -- Oração

Oração

A Rachel Batista

Produzir poemas
É produzir algo
Entre o simples e o achado
Entre a folha e o machado
É registrar um suspiro
Que nos conceitua
Que nos ofusca
Por vezes
É captar o olhar fugidio
De um azul luzidio
De uma declaração num suspiro
Produzir o pão de momentos passados
Chamados amados lembranças
Lenços negros em negras luvas
Um aceno num tormento
Sutil desistência lúdica
Maré de tormenta
Tremendas mãos pedindo oração
Produzir poemas
É produzir silêncios
Num coração assustado pela vida
Grande ferida que não tem tempo de cicatrizar


Do livro HÁmor, 2014.

terça-feira, 19 de abril de 2016

366 dias com poesia, 19 de abril de 2016 -- diamantes

diamantes

se o mundo é cravejado de suntuosos insultos
por que não escrever uma palavra que cale fundo
e ponha seus olhos para brilhar?


Do livro HÁmor, 2014.

segunda-feira, 18 de abril de 2016

366 dias com poesia, 18 de abril de 2016 -- A princesa e o sapo



A princesa e o sapo

Talvez a única vantagem de envelhecer seja aprender
Mas para aprender temos que ter atenção
Quando Colllor foi impichado
Dilma já tinha pra lá de quarentinha
E parece que não prestou atenção que o motivo do impedimento
Do super-homem das Alagoas foi menos a denúncia do irmão e mais o fato de já estar isolado
Sem interlocutores que o ouvissem e quisessem defendê-lo

A falta de interlocutores é que acaba com a carreira política
Quanto mais interlocução mais poder de convencimento
Dilma optou por fechar-se em seu mundo de Alice
(aliás grande defeito de Brasília, como sede do governo central)
E somente ouvir aqueles poucos que confiava
A cada crise colocava mais na conta do palhaço
E seguia enfiando a cabeça no buraco
Produzido em grande parte pela prática de dar ministérios ao primeiro borra-botas que tivesse meia dúzia de votos no Congresso

Nossa princesa esqueceu que os conselhos do espelho muitas vezes são só para mantê-lo intacto e preferiu acreditar que um dia o príncipe sapo a salvaria do tão temido dragão (da inflação,da incompreensão)

Infelizmente já sabemos essa história de cor e salteado e sabemos que quem vai pagar o pato é o zé povinho que se chegar a envelhecer talvez não tenha interlocutores para ensinar a aprender

domingo, 17 de abril de 2016

366 dias com poesia, 17 de abril de 2016 -- ANUNCIAÇÃO

anunciam-se novos tempos
com novos ventos
tempo de ilusão
esperança de mudança
alimento d'alma
que nos faz esboçar um sorriso
meninos e meninas torcem
empunhando bandeiras e certezas
não sabem que ali na mesma esquina ou na esplanada
velhos olhos em pescoços marcados
já sabem que quase nada irá mudar

o poder inebria e faz com que o homem esqueça de seu semelhante
o pão não será dividido o vinho já foi bebido

infelizmente

não haverá comunhão

sábado, 16 de abril de 2016

366 dias com poesia, 16 de abril de 2016 -- reluz



reluz

Vendo uma obra de Paulo Della Nina

não sei se sou o símbolo ou a sombra

se estou no quarto ou se o quarto está em mim

no fundo sou tudo
porque me criei para deus

crio a cor
esculpo a flor
pinto a dor

o escuro me reflete e eu reflito enquanto há luz 

sexta-feira, 15 de abril de 2016

366 dias com poesia, 15 de abril de 2016 -- GAIVOTAS (versão da música Castles made of sand, de Jimi Hendrix)

por que você pode me dizer por que os castelos de areia foram derrubados?
posso tomar conta da
ilusão, coisa mais bonita da vida
que preenche nossos olhos de sonhos

por que esquecemos de nós?

não se esqueça de sonhar
porque sonhar é voar
vamos mergulhar...

GAIVOTAS


quinta-feira, 14 de abril de 2016

366 dias com poesia, 14 de abril de 2016 -- e s c r e v o

e  s  c  r  e     v o

escrevo
escrevo pelo
escrevo pelo sofrimento
escrevo pelo sofrimento da
escrevo pelo sofrimento da consciência
escrevo pelo sofrimento da consciência da
escrevo pelo sofrimento da consciência da perda
escrevo pelo sofrimento da consciência da pedra


Do livro HÁmor, 2014.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

366 dias com poesia, 13 de abril de 2016 -- surfistas

surfistas

A Gabriel e Matheus Dargam

quem sabe da vida?
os surfistas!
cada onda
segundos de prazer que se vão
quase numa piscada
e logo o esforço para passar a arrebentação
minutos de sufoco
em nova batalha pelo que foi perdido
quedas vacas água salgada
novas braçadas

(vagas vãs para os que da areia esboçam um sorriso sem graça)


Do livro HÁmor, 2014.

terça-feira, 12 de abril de 2016

366 dias com poesia, 12 de abril de 2016 -- calos

calos

duas pétalas de flor caídas no chão
não são amor
o amor
é a flor completa
com caule
folhas e espinhos
numa mão
calejada de intenções


Do livro HÁmor, 2014.

segunda-feira, 11 de abril de 2016

366 dias com poesia, 11 de abril de 2016 -- poeta-mãe

poeta-mãe

meu futuro não é muro é da derrubada que falo é um simples estalar de tijolos no chão simples mas necessário a força é meu ganha pão todos os dias escuto que não posso escuto vozes falando que não devo vejo olhos se esforçando em me impedir e a força necessária para parir um poema é que me dá a dimensão do amor de mãe


Do livro HÁmor, 2014.

domingo, 10 de abril de 2016

366 dias com poesia, 10 de abril de 2016 -- cisco

cisco

Desenho em cor
O perfume que me ficou
Da perda
Pedra
Dum tamanho indescritível
Cerda
De tamanho quase invisível
Mas que incomoda
Em todos os momentos
De olhos abertos, um cisco
De olhos fechados, a sutil possibilidade do sono


Do livro HÁmor, 2014.

sábado, 9 de abril de 2016

366 dias com poesia, 09 de abril de 2016 -- ADEREÇO

ADEREÇO

A Fábio Dargam

Não se engane...
O melhor de tudo é estar fazendo e curtindo o couro só amolece com sal e sol maracanã futebol é para os que merecem mas quem somos os que merecem? Quem queremos ser quem corre para saber? Quem quer se ver no espelho quem reconhece os próprios medos desejos são só desejos ou são beijos que propiciam além da rima uma pequena alegria não se enganem hoje sei quem sou e posso dizer sem medo perdoar não porque seja melhor mas apenas pela inteligência de me livrar de algo que não me pertence não quero ficar com a batata quente nas mãos são uma opção de continuar agarrado a quem sou mãos são a coroação do esforço de querer algo um pouco maior do que mereço talvez é só uma palavra não é o que penso talvez é nesse caso um adereço


Do livro HÁmor, 2014.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

366 dias com poesia, 08 de abril de 2016 -- horizonte

horizonte

se algum sentido viver faz
onde está o caminho?
onde começa o canto dos passarinhos?
onde se escondem os ninhos inteiros?
se quero sentir
por que não nascer
deixar fluir-me em instintos,
em palavras inventar uma oração?
por que devo me reduzir a mim esperando que algo me plante que algo me floresça?

nosso destino está na nossa cabeça


Do livro HÁmor, 2014.

quinta-feira, 7 de abril de 2016

366 dias com poesia, 07 de abril de 2016 -- folhas e galhos

folhas e galhos

é mais tarde
do que eu imagino
as folhas já caíram
os galhos não têm mais histórias
o gelo aumenta o mar
o rio deságua mágoas
vindas de outras partes
outras terras
concretas quimeras faleceram ali
crianças devem ter espalhado pétalas brincando de felicidade
piqueniques entre amigos dissiparam solidões
onde estão as nascentes das letras?
onde está a foz das palavras?


Do livro HÁmor, 2014.

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Novidade na arte -- fragmento de Christina Bach sobre Jorge Guinle

(...) Afinal, o que havia de "novo" nessas atitudes? Nada especialmente, e muito.
O "novo" já não mais seduz o artista, que agora olha para tudo e para todos como "inspiração", ou melhor, como excitação: tudo já foi feito, é só recolher os fragmentos que estão à mão, combiná-los e recombiná-los de modo que faça algum "sentido", seja lá o que isso queira dizer. Convulsionando o estabelecido, tal procedimento vai conferir um aspecto de crise, de busca e experimentação ao momento. Daí parecer oscilar entre o "novo" e o "déja vu". Ora, decerto que entre utilizações gauches, citações, cópias baratas e o bom uso correu muita tinta.

O que se percebe, portanto, não é o "novo", mas uma reflexão poética sobre o que já foi feito. Assim, conhecimentos anteriores são rearranjados e nenhuma novidade é avistada. "Novo" é somente o não-familiar -- frequentemente uma mistura ainda não realizada de dois "velhos": uma espécie de evolução darwinista. Não é possível fazer coisas totalmente novas a partir do nada, tem de haver alguma coisa antes para se obter uma variação das coisas existentes. Alegar ou exigir um "novo" a essa altura dos acontecimentos é endossar uma compulsão vanguardista: ainda não será desta vez que se vai exaurir a história da arte." (...)

366 dias com poesia, 06 de abril de 2016 -- S.A.U.D.A.D.E

S.A.U.D.A.D.E

À memória de Bertha Plácido

Só

Arde

Uma vez em cada respiração

De dia

Arde muito menos... (a rotina anestesia sentimentos), a noite

Dói mais, quando relembro, sozinho, sua luta pela vida...

Esforço inútil, mas última lição.


Do livro HÁmor, 2014.